A
Revista Educação do grupo Segmento, de circulação Nacional, apresenta o
Municipio de Vera Cruz como modelo de inovação no processo educacional
brasileiro.Parabéns a toda equipe educacional do municipio especialmente
os alunos e professores da Escola Maria Geralda da Conceição, citada na
reportagem.
Revista Educação de Agosto de 2012.
Lições de inovação
Como
escolas públicas brasileiras conseguiram envolver os pais nas tarefas
escolares, mesmo quando não tinham repertório para isso, e melhoraram o
desempenho de seus alunos
Carmen Guerreiro
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A professora de língua portuguesa, Miraildes Bispo,
da Escola Municipal Maria Geralda da Conceição, BA: com o aumento da
lição de casa, os resultados já são percebidos |
Em
2009, a rede municipal de educação de Vera Cruz, município do interior
da Bahia, decidiu enfrentar o mesmo dilema de muitas escolas e redes
brasileiras que atendem a uma população mais pobre: sendo a maioria dos
pais iletrada e trabalhando fora em diversos turnos, pouco ou nada
conseguiam ajudar seus filhos com as tarefas que traziam da escola para
casa. Seja por desestímulo, por falta de cobrança ou por dúvidas que não
podiam ser respondidas pelos pais, os estudantes acabavam por ignorar a
lição de casa. Mas em vez de diminuir o ritmo do dever, a rede o
aumentou. Isso com o compromisso de que, no dia seguinte, na escola, o
aluno tivesse a oportunidade de se sentar junto a um professor para
corrigir a atividade. Os estudantes têm a opção, ainda, de fazer a lição
de casa no contraturno, já que as escolas passaram a funcionar em
período integral e reservam um tempo para essa atividade, com um
professor para orientar e tirar as dúvidas.
"A lição serve como reforço às atividades da sala de aula para
estimular o aluno com uma abordagem interessante que faça resumo do que
foi ministrado em classe, para que ele crie esse vínculo de aprender e
estudar em grupo ou sozinho", afirma Silvano Sulzarty, professor da
Universidade do Estado da Bahia (Uneb) e coordenador pedagógico da
Escola Maria Geralda da Conceição, uma das 53 da rede de Vera Cruz.
Sulzarty conta que a reação de muitos pais em princípio foi negativa,
porque o contraturno, usado também para o reforço da lição, impedia os
jovens de trabalhar. "Estamos em uma região que infelizmente ainda tem
muito trabalho infantil, por isso muitas crianças ficavam sem fazer as
lições de casa devido à falta de tempo ou ao esgotamento em que chegavam
em casa à noite, por estarem trabalhando." Com o tempo, a reação
diminuiu e os resultados apareceram. Sulzarty conta que o desempenho dos
alunos melhorou cerca de 60% por causa da iniciativa, mas que em
algumas escolas esse índice chega a 80% (isso é avaliado por provas
semestrais desde que as mudanças foram implementadas).
Crianças investigadoras
Da
Bahia ao Ceará, a mesma questão: a falta de envolvimento dos pais (ou
interferência negativa) também fazia com que as crianças da Escola
Municipal de Educação Infantil José Perboyre Sampaio Sabiá, em Juazeiro
do Norte, tivessem pouco ou nenhum envolvimento com a lição. "Percebemos
que elas não tinham acompanhamento em casa, não tinham estudo dirigido,
e isso dificultava o nosso trabalho", conta Lygia de Oliveira, diretora
da escola. "Quando havia um feriado, por exemplo, ou não havia aula, os
alunos retrocediam." Isso quando a lição não vinha feita pelos pais,
perdendo completamente o seu propósito. Para manter o contato com o
conhecimento e atividades voltadas para o desenvolvimento infantil
constantes, a equipe pedagógica da escola elaborou o projeto De Casa
Para Sala/ Da Sala Para Casa. O objetivo da iniciativa é dar
continuidade ao trabalho feito em sala de aula, enviando propostas de
leitura, pesquisa de informações e propostas de atividades lúdicas
relacionadas ao que foi trabalhado em classe naquele dia, para estimular
o espírito investigador das crianças e envolver os pais nas atividades.
Diferentemente da lição de casa tradicional, focada na reprodução de
exercícios que geram um padrão semelhante, o propósito do projeto é que
as próprias crianças usem como base seus conhecimentos prévios e
pessoais, juntem a isso o que aprenderam na sala de aula, pesquisem
novos saberes e criem algo novo que reflita o processo de aprendizado.
"É a criança construir por ela mesma. É fazê-las pensar sobre o que
estão produzindo, desenvolver um senso crítico. A criança compreende
melhor o mundo dessa forma, porque observa e, sozinha, espontaneamente,
faz suas descobertas", diz Lygia. Em paralelo, a escola passou a chamar
mais os pais para atividades no ambiente escolar, tanto em reuniões,
quanto em atividades de estímulo à leitura e empréstimo de livros.
Tomadas pelo gosto de ler, as famílias tenderam a se envolver mais com a
vida escolar dos filhos.
Internet e incentivo
Despertar
o interesse da família pela vida escolar e, por consequência, pela
lição de casa dos filhos, foi a mesma solução encontrada pela professora
Taiz Helene Valenzuela, da Escola Municipal de Ensino Fundamental
Associação da Paz, em Paragominas, interior do Pará. Boa parte dos pais
estuda na turma de Educação de Jovens e Adultos (EJA) da escola, e
frequentemente estão aprendendo conteúdos atrasados em relação aos seus
filhos. "Eles reclamavam que não sabiam ler e não tinham estudos, por
isso não podiam ajudar com a lição. Mas eu falava que só o fato de
perguntar para o filho se ele está fazendo ou não já é um incentivo",
relembra Taiz. Foram necessárias muitas reuniões de conscientização para
a importância da tarefa. Quando conseguiu garantir o maior envolvimento
das famílias, a professora investiu na principal ação para que seus
alunos, do 4º ano, passassem a fazer o dever de casa: propor uma
atividade criativa e interessante, conectada a sua realidade.
Assim, Taiz criou uma webquest, um site propondo uma situação
relacionada ao tema trabalhado em sala de aula, com instruções para
fazer, de casa, uma pesquisa orientada na internet em torno do assunto, e
assim agregar conhecimento junto aos colegas de volta à classe. "A
preparação deles para a aula melhorou, e por isso a participação em
classe aumentou. Hoje existe a interação dos alunos, e me sinto a
mediadora na sala de aula, e não mais aquela que transmite conteúdo",
afirma.